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domingo, 11 de julho de 2021

Quem é a Pedra?


  

Mateus 16:18

“Eu lhe digo que você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do Hades não poderão vencê-la”.

 

Já faz muito tempo que esta discussão vem no seio da cristandade, trazendo interpretações e posicionamentos, ora a favor de Pedro ser a “pedra” mencionada na fala de Jesus, ora a favor de Jesus mesmo ser esta “pedra” – e não Pedro. Católicos, de forma geral, defendem a primeira opção – até para justificar o papado – e protestantes defendem a segunda.

Creio que devemos ampliar a percepção, buscando os antecedentes daquela passagem. Esta declaração de Jesus se dá em função de uma fala de Pedro, respondendo a uma pergunta de Jesus. Vamos, agora, posicionar Jesus e os discípulos – inclusive Pedro – no cenário em que se dá esta passagem.

Jesus os levava a Cesareia de Filipe, uma região remota, impregnada ainda de paganismo, cheia de sincretismos e misticismos comuns àqueles tempos. Não era a “sagrada” Jerusalém, mas a “pagã” Cesareia de Filipe, construída em homenagem a César, imperador romano.

Jesus quisera saber de Seus discípulos qual a interpretação que tinham d’Ele, qual a percepção e a impressão que Jesus causava neles, Seus discípulos. Jesus queria saber deles Quem Ele era para eles. Para isso, Ele começou perguntando-lhes sobre o que pensavam e diziam os outros a respeito d’Ele. Eis como começa o diálogo: Chegando à região de Cesareia de Filipe, perguntou aos seus discípulos: “Quem os outros dizem que o Filho do homem é?” Eles responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros, Elias; e, ainda outros, Jeremias ou um dos profetas”. (Mateus 16:13-14).

As respostas do povo, “dos outros”, eram diversas. Cada um tinha uma interpretação, uma forma de ver Jesus, uma forma de entender Quem Ele era. Parecido com hoje em dia: as pessoas, se as perguntarmos sobre Quem é Jesus para elas, virão com as mais variadas respostas. Experimente perguntar...

Aí Jesus faz a pergunta que queria mesmo fazer: “E vocês?”, perguntou ele. “Quem vocês dizem que eu sou?” (Mateus 16:15).

Diante dessa pergunta, Simão foi o primeiro a responder, e deu a “resposta certa”: Simão Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mateus 16:16). Poderia ter sido qualquer outro a responder, mas foi Simão. Pode ser – e aí é uma interpretação muito pessoal – que algum outro dos discípulos tivesse a mesma resposta, mas Simão foi mais rápido. Ou então todos concordaram em seu íntimo com essa resposta, mas não falaram. Fato é que Simão falou.

Jesus, ouvindo isso, declarou que esta resposta não era de cunho humano, nem filosófico, nem religioso em si, mas que viera como revelação de Deus: Respondeu Jesus: “Feliz é você, Simão, filho de Jonas! Porque isto não lhe foi revelado por carne ou sangue, mas por meu Pai que está nos céus” (Mateus 16:17). A revelação sobre Quem Jesus era viera diretamente de Deus! E quem a captara rapidamente fora Simão!

E aí Jesus declara: “Eu lhe digo que você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do Hades não poderão vencê-la” (Mateus 16:18). Jesus acrescenta ao nome de Simão a denominação Pedro (do grego petros, significando pedra). Simão Pedro externara a revelação recebida do Pai, sobre Quem Jesus era para ele e para seus colegas discípulos: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Esta revelação/percepção petrificou/pavimentou o caminho do Evangelho! Sobre esta revelação a Igreja seria erigida!

Para dirimir dúvidas ainda porventura existentes sobre “quem é a pedra”, podemos percorrer mais algumas citações das Escrituras, que nos ajudarão no entendimento.

O próprio Pedro jamais se referiu a si mesmo como sendo esta pedra, mas de forma clara e consistente, ele diz que esta pedra representa Cristo (“Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”). No discurso que ele faz no Templo, muito tempo depois, ele chega a dizer que não há nenhum outro nome debaixo do céu, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos, a não ser através desta “pedra”, rejeitada pelos homens: Então Pedro, cheio do Espírito Santo, disse-lhes: “Autoridades e líderes do povo! Visto que hoje somos chamados para prestar contas de um ato de bondade em favor de um aleijado, sendo interrogados acerca de como ele foi curado, saibam os senhores e todo o povo de Israel que por meio do nome de Jesus Cristo, o Nazareno, a quem os senhores crucificaram, mas a quem Deus ressuscitou dos mortos, este homem está aí curado diante dos senhores. Este Jesus é a pedra que vocês, construtores, rejeitaram, e que se tornou a pedra angular’. Não há salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (Atos 4:8-12).

Ainda, Pedro escreve a respeito, numa de suas cartas: À medida que se aproximam dele, a pedra viva – rejeitada pelos homens, mas escolhida por Deus e preciosa para ele – vocês também estão sendo utilizados como pedras vivas na edificação de uma casa espiritual para serem sacerdócio santo, oferecendo sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus, por meio de Jesus Cristo. Pois assim é dito na Escritura: “Eis que ponho em Sião uma pedra angular, escolhida e preciosa, e aquele que nela confia jamais será envergonhado”. Portanto, para vocês, os que creem, esta pedra é preciosa; mas para os que não creem, “a pedra que os construtores rejeitaram, tornou-se a pedra angular”, e, “pedra de tropeço e rocha que faz cair”. Os que não creem tropeçam, porque desobedecem a mensagem; para o que também foram destinados (1º Pedro 2:4-8).

Jesus usou várias vezes este símbolo da “pedra” referindo-se a Si mesmo: “Vocês nunca leram isto nas Escrituras? ‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isso vem do Senhor, e é algo maravilhoso para nós’” (Mateus 21:42). “Então, qual é o significado do que está escrito? ‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular’. Todo o que cair sobre esta pedra será despedaçado, e aquele sobre quem ela cair será reduzido a pó” (Lucas 20:17-18).

No Antigo Testamento encontramos diversas passagens que relacionam a “pedra/rocha” como um termo específico para Deus, como estas, dentre outras: “Proclamarei o nome do SENHOR. Louvem a grandeza do nosso Deus! Ele é a Rocha, e suas obras são perfeitas, e todos os seus caminhos são justos. É Deus fiel, que não comete erros; justo e reto ele é” (Deuteronômio 32:3-4). O SENHOR é a minha rocha, a minha fortaleza e o meu libertador; o meu Deus é o meu rochedo, em quem me refugio. Ele é o meu escudo e o poder que me salva, a minha torre alta (Salmo 18:2).

Isaías, o mais “evangélico” dos profetas – pois profetizou muito a respeito do Cristo – menciona a grande “rocha” em terra sedenta, e a “pedra” preciosa, angular, solidamente assentada: Cada homem será como um esconderijo contra o vento e um abrigo contra a tempestade, como correntes de água numa terra seca e como a sombra de uma grande rocha no deserto (Isaías 32:2). Por isso diz o Soberano, o SENHOR: “Eis que ponho em Sião uma pedra, uma pedra já experimentada, uma preciosa pedra angular para alicerce seguro; aquele que confia, jamais será abalado (Isaías 28:16). Na primeira passagem, o profeta “estende” o “alcance” da “rocha”, dizendo mesmo que “cada homem” – e não um único – será “como a sombra de uma grande rocha no deserto”.

O apóstolo Paulo também referenda Cristo como a “pedra/rocha”: Todos comeram do mesmo alimento espiritual e beberam da mesma bebida espiritual; pois bebiam da rocha espiritual que os acompanhava, e essa rocha era Cristo (1º Coríntios 10:3-4). Paulo “bebia” das Escrituras antigas para basear a sua afirmação, como o profeta Samuel e o salmista: Pois quem é Deus além do SENHOR? E quem é Rocha senão o nosso Deus? (2º Samuel 22:32). O Salmo 18:31 repete esta palavra de Samuel, ipsis litteris.

Jesus também Se referiu à “pedra/rocha” como sendo a Sua Palavra, a qual é o único alicerce seguro para o homem: “Portanto, quem ouve estas minhas palavras e as pratica é como um homem prudente que construiu a sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela não caiu, porque tinha seus alicerces na rocha” (Mateus 7:24-25).

E, em Jesus Se referindo à “pedra/rocha” como sendo a Sua Palavra, a Escritura ainda afirma ser Ele “a Palavra”: No princípio era aquele que é a Palavra. Ele estava com Deus, e era Deus (João 1:1).

Jesus amalgama a Si mesmo e Suas Palavras, como se fossem uma só essência: “Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras nesta geração adúltera e pecadora, o Filho do homem se envergonhará dele quando vier na glória de seu Pai com os santos anjos” (Marcos 8:38).

Falando de Si como enviado de Deus, diz que é Ele Quem fala as Palavras de Deus, e Quem tem o poder de “dar” o Espírito Santo: “Pois aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus, porque ele dá o Espírito sem limitações (João 3:34).

Jesus enfatiza ainda que Sua Palavra é “viva”: O Espírito dá vida; a carne não produz nada que se aproveite. As palavras que eu lhes disse são espírito e vida (João 6:63).

Pedro também reconhecia a eternidade em Jesus e Suas Palavras: Simão Pedro lhe respondeu: “Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida eterna. Nós cremos e sabemos que és o Santo de Deus” (João 6:68-69).

E Jesus, em oração, enfatiza outra vez a relação amálgama entre Ele e a Palavra de Deus: “Pois eu lhes transmiti as palavras que me deste, e eles as aceitaram. Eles reconheceram de fato que vim de ti e creram que me enviaste (João 17:8).

O apóstolo Paulo, escrevendo à Igreja em Corinto, afirma que Cristo é o único “fundamento/alicerce/pedra” da Igreja: Ninguém pode colocar outro alicerce além do que já está posto, que é Jesus Cristo (1º Coríntios 3:11). E à igreja em Éfeso, também diz que Cristo é o “fundamento/pedra” sobre o qual construímos o templo espiritual como pedras vivas: Portanto, vocês já não são estrangeiros nem forasteiros, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, tendo Jesus Cristo como pedra angular, no qual todo o edifício é ajustado e cresce para tornar-se um santuário santo no Senhor. Nele vocês também estão sendo edificados juntos, para se tornarem morada de Deus por seu Espírito (Efésios 2:19-22).

Buscando fazer um apanhado final agora, e voltando ao início do texto, pode-se dizer que, quando Pedro fez sua declaração de fé sobre “Quem Jesus era”, ele o fez em nome de todos os demais discípulos, pois a pergunta havia sido feita ao grupo: “E vocês?”, perguntou ele. “Quem vocês dizem que eu sou?” (Mateus 16:15).

Nenhum dos discípulos jamais entendeu que Jesus estava concedendo a Pedro uma distinção especial. Tanto é assim que, depois de passado este fato, eles continuavam falando entre si sobre quem seria o maior: Os discípulos chegaram a Jesus e perguntaram: “Quem é o maior no Reino dos céus?” (Mateus 18:1). Lucas, em seu Evangelho, diz mesmo que havia uma discussão entre os discípulos a respeito deste tema: Começou uma discussão entre os discípulos acerca de qual deles seria o maior. Jesus, conhecendo os seus pensamentos, tomou uma criança e a colocou em pé, a seu lado. Então lhes disse: “Quem recebe esta criança em meu nome, está me recebendo; e quem me recebe, está recebendo aquele que me enviou. Pois aquele que entre vocês for o menor, este será o maior” (Lucas 9:46-48). Caso Jesus tivesse dado a Pedro uma posição de supremacia ou mesmo liderança, não haveria mais motivo para tanta discussão – Ele poderia encerrar a discussão assim: “Pedro é o chefe!”

Os autores do Novo Testamento jamais fizeram menção de qualquer autoridade revestida sobre Pedro, muito menos colocando ele como “rocha/pedra/base” para construir a Igreja.

Pedro jamais foi “papal” ou “infalível” como apóstolo, tanto que chegou a ser confrontado e corrigido veementemente por seu colega Paulo. No relato a seguir Paulo conta aos seus irmãos da Igreja na Galácia sobre o encontro com os apóstolos e seu conflito com Pedro, que se dera a respeito de “usos e costumes judaicos”: Quanto aos que pareciam influentes – o que eram então não faz diferença para mim; Deus não julga pela aparência – tais homens influentes não me acrescentaram nada. Ao contrário, reconheceram que a mim havia sido confiada a pregação do evangelho aos incircuncisos, assim como a Pedro, aos circuncisos. Pois Deus, que operou por meio de Pedro como apóstolo aos circuncisos, também operou por meu intermédio para com os gentios. Reconhecendo a graça que me fora concedida, Tiago, Pedro e João, tidos como colunas, estenderam a mão direita a mim e a Barnabé em sinal de comunhão. Eles concordaram em que devíamos nos dirigir aos gentios, e eles, aos circuncisos. Somente pediram que nos lembrássemos dos pobres, o que me esforcei por fazer (Gálatas 2:6-10). Quando, porém, Pedro veio à Antioquia, enfrentei-o face a face, por sua atitude condenável (Gálatas 2:11). Quando vi que não estavam andando de acordo com a verdade do evangelho, declarei a Pedro, diante de todos: “Você é judeu, mas vive como gentio e não como judeu. Portanto, como pode obrigar gentios a viverem como judeus?” (Gálatas 2:14). Podemos ver, pelo que lemos acima que, junto a Pedro, havia Tiago e João com papel de liderança, assim como líderes eram Paulo e o próprio Barnabé.

Ainda, voltando a Pedro, devemos lembrar que ele havia negado a Jesus por três vezes na noite em que o Senhor foi preso para posterior condenação, e que isto, sem dúvida, magoou a Pedro profundamente, pois ele foi chorar amargamente depois disso: Pedro respondeu: “Homem, não sei do que você está falando!” Falava ele ainda, quando o galo cantou. O Senhor voltou-se e olhou diretamente para Pedro. Então Pedro se lembrou da palavra que o Senhor lhe tinha dito: “Antes que o galo cante hoje, você me negará três vezes”. Saindo dali, chorou amargamente (Lucas 22:60-62).

Depois de ressuscitado, Jesus tem uma conversa particular e muito passional com Pedro, restaurando-o, demonstrando a ele que aquele episódio da negação estava completamente superado e, para fortalecê-lo, deu-lhe uma especial incumbência: Depois de comerem, Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João, você me ama mais do que estes?” Disse ele: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”. Disse Jesus: “Cuide dos meus cordeiros”. Novamente Jesus disse: “Simão, filho de João, você me ama?” Ele respondeu: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”. Disse Jesus: “Pastoreie as minhas ovelhas”. Pela terceira vez, ele lhe disse: “Simão, filho de João, você me ama?” Pedro ficou magoado por Jesus lhe ter perguntado pela terceira vez “Você me ama” e lhe disse: “Senhor, tu sabes todas as coisas e sabes que te amo”. Disse-lhe Jesus: “Cuide das minhas ovelhas” (João 21:15-17). Jesus dava, assim, a Pedro um papel muito importante: um papel pastoral de acompanhamento e apascentamento.

É preciso notar, porém, que em nenhum momento Pedro ganhou a incumbência de “apóstolo chefe”, nem foi designado algum tipo de “apóstolo maior que os demais”, nem ganhou um cargo exclusivo de “representante de Jesus na Terra”, nem coisa do tipo.

Pessoalmente, hoje, creio ser um simplismo este tipo de discussão sobre “quem é a pedra”, pois está claro que Jesus É o sustentáculo de tudo, e que todos nós somos irmãos n’Ele, conforme Ele mesmo deixa muito claro, uma vez e para sempre: “Mas vocês não devem ser chamados ‘rabis’; um só é o Mestre de vocês, e todos vocês são irmãos. A ninguém na terra chamem ‘pai’, porque vocês só têm um Pai, aquele que está nos céus. Tampouco vocês devem ser chamados ‘chefes’, porquanto vocês têm um só Chefe, o Cristo. O maior entre vocês deverá ser servo. Pois todo aquele que a si mesmo se exaltar será humilhado, e todo aquele que a si mesmo se humilhar será exaltado” (Mateus 23:8-12).

 

Por hora é isso, pessoal. Que a liberdade e o amor de Cristo nos acompanhem.

Saudações,

Kurt Hilbert

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