Há quem julgue o ensino de Jesus muito romântico e sem senso
de realidade. Afinal, o que Ele manda fazer e ser é completamente contrário
àquilo que o fluxo deste mundo chama de realidade e objetividade.
Quem ganha guerras amando o inimigo?
Quem vai a qualquer lugar se perdoa sempre?
Quem lucrará de modo capitalista se fizer aos outros antes
aquilo mesmo que deseja que os outros façam a ele?
Em que sociedade o maior deve ser o menor, e o último o
primeiro?
Em que filosofia o caminho do ser é o de se fazer como uma
criança?
Quem prosperará se não se inquietar com o dia de amanhã?
Quem sobrevive sendo verdadeiro sempre?
Quem vai a qualquer lugar se não aliar-se aos poderes
vigentes?
Quem se satisfaz sendo tão discreto que a mão direita não
pode nem se gabar do que fez a esquerda?
Quem consegue ser tão livre, que simplesmente não reconheça
fronteiras, e que se sinta bem-vindo em qualquer lugar onde for bem-vindo, pois
não conhece o preconceito?
Quem não se amargurará também ao não ser recebido pelos seus
próprios?
Quem, tendo todo o poder, decide não usá-lo?
Quem, podendo se impor, apenas deixa “chegar a hora”?
Quem, podendo esmagar, se deixa antes executar?
Quem, podendo dar um show que agilize o caminho, preferirá,
ao invés, andar nos desertos, e associar-se a gente pequena, e dedicar a sua
vida à cura dos doentes de corpo e alma?
Quem, podendo curar, curando proíbe os curados de falarem que
foi dele que veio o benefício?
Quem sacrificaria um jantar com amigos ricos para oferecer
uma ceia para mendigos e desconhecidos pobres?
Quem faz do amor um caminho de transgressão ante os olhos dos
juízes da moral e, ainda assim, jamais negocia o que sabe ser verdade e bom?
Quem confia ao Pai a própria vida, e aceita todo e qualquer
absurdo e, ainda assim, sabe morrer entregando ao Pai o espírito?
Sim, para muitos, senão para todos, o Evangelho é
insuportável e, por isto, mesmo quando todos dizem que ele está certo, ainda
assim poucos se aventuram a levá-lo à sério.
Jesus, todavia, não era romântico. Se Ele come carne é porque
animais morrem. Se bebe vinho é porque sabe que vides precisam ser plantadas.
Se fala de casas que não sucumbem ao tempo é porque sabe que casas precisam ser
construídas. Se transforma água em vinho é porque sabe que a frustração pode
acabar com a alegria de um casamento. Se multiplica alimentos é porque sabe que
o homem não vive somente da Palavra que sai da boca de Deus, mas também de pão.
Se entra em barcos é porque reconhece a gravidade da “lei da gravidade”. Se
dorme é porque sabe que sem descanso não se vive. Se chora a morte de um amigo
é porque reconhece que não existe vida sem emoção.
Entretanto, Jesus estabelece limites. Ele deixa claro que a
cobiça, os excessos, as luxúrias e todas as ambições tornariam a vida
impossível na Terra.
Hoje, quem se atreve a dizer que nosso senso de realidade e
de objetividade são de fato reais e objetivos?
Sim, diante de tudo o que nossa realidade e nossa
objetividade produziram como morte em proporções globais, quem se atreve a
dizer que o romântico é Jesus?
Não, amigos! Digamos que não suportamos, que não aguentamos
viver diferente, que nosso egoísmo e nosso imediatismo nos governam, qualquer
coisa... mas não digamos que Jesus é romântico.
Românticos e idiotas somos nós, os insaciáveis, os
implacavelmente cobiçosos, os senhores e sujeitos de seus próprios medíocres
destinos, os poderosos que não têm nem mesmo o senso de realidade que assume
que nós próprios, quais idiotas incuráveis, somos aqueles que, por ambição,
omissão, ou mero comodismo, estamos tratando real e objetivamente de nos
auto-destruirmos.
Sim, digamos antes que o Evangelho é insuportável, mas não
digamos que ele é romântico, pois nada há mais verdadeiro, nem tampouco mais
real e chocantemente profilático a indicar o caminho da vida, e não da morte,
quanto o Evangelho de Jesus.
Mas Ele perguntou: “Quando vier o Filho do Homem, porventura
achará fé na Terra?”
Um texto de Caio Fábio D’Araújo Filho
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