O modo comum das pessoas
pensarem em oração é o mesmo com o qual elas pensam em “concentração mental”.
Comumente se pensa que a força da oração é do tamanho do esforço mental feito
pela pessoa que ora. Desse modo, se crê que os ouvidos de Deus são abalados
pelas emissões de nossas energias de grito mental e, frequentemente, gritos
mesmo. Também se pensa que somos nós quem damos o tema da oração para Deus.
Espiritualmente, entretanto, o processo é justamente o inverso.
Não é Deus quem pára para me
ouvir. Eu é que devo ficar em oração até ouvir Deus. Todos nós sabemos há muito
que a oração não muda a Deus; muda, sim, aquele que ora.
Oração é um contínuo processo
de pensar não de si-para-si, mas em Deus; não digo “em Deus” como se Deus fosse
o “objeto” da nossa concentração mental; como se faz com “um deus” que tem que
ser alcançado, que está longe e, portanto, é um outro objeto, ainda que eu o
chame de “Deus”. Não! Assim como a Verdade, a oração não é um trabalho mental,
nem é objeto de uma teologia, nem de uma doutrina; muito menos é sonho e
mágica.
Oração é um pensar-ouvir-ser em
Deus. Oração é um ato, não é uma mecânica. O ato de orar é como o ato de viver.
Os temas da oração são sempre os temas do ser; daí, haver sempre oração, mesmo
quando estou em silêncio. O Pai vê em secreto!
Orar é conexão, é relação, é
vinculo, é segredo! É como passar um e-mail para um amigo, mas só se poder ter
a certeza de que a notícia vai chegar se a conexão acontecer — e a gente só
sabe que a notícia chegou porque há resposta; sendo que o “provedor de acesso”
é amor, sinceridade flagrante, e nudez espiritual.
Quem ora deve saber que se
trata de uma relação que não aceita brincadeira de esconde-esconde. Aquele que
ora aceita ficar nu até onde lhe seja possível enxergar-se por inteiro. Sem
nudez espiritual não há oração!
Oração é também gratidão. E a
gratidão da oração não é pelas coisas recebidas, e nem pelas conquistas; pois,
se assim fosse, eu só poderia agradecer umas poucas vezes na vida. Não! Oração
é gratidão por Deus! E essa gratidão em Deus e por Deus é aquilo que Paulo diz
que santifica todas as coisas! A gratidão é a oração que limpa os olhos; e não
somente eles, mas limpa o nosso olhar do mundo. Assim, todas as coisas ficam
puras pelas ações de graças.
E quando alguém ora, não deve
nunca duvidar, mesmo quando demorar a resposta ou nem vier, visto que nem
sempre Deus responde o que queremos. Ainda que sempre responda me propondo o
que faz bem, mesmo quando dói.
Quem ora, nunca não está
orando. Cada respiração, topada, cabeçada, cafuné, beijo, abraço, compreensão,
susto, morte, nascimento, estação do ano, brisa, chuva, tempestade, calor, frio,
roupa, banho, toalha, coalhada, rapadura, gol, copa do mundo, mergulho em água
fria, visão do mar, surpresa do pôr de sol, gozo, amizade, tristeza, obstáculo,
perseguição, simpatias, questões, medos, certezas... sim, tudo passa a ser
oração.
Ora, quando Paulo diz que todas
as coisas são santificadas pelas ações de graças, ele não está nos ensinando um
truque para transformarmos o errado em certo ou a injustiça em justiça. Explore
ou julgue a viúva, o órfão, o pobre, o fraco, o cansado, o esmagado, o culpado,
o ferido, o inocente ou quem quer que seja, e sua oração será a sua própria
maldição. Se alguém pensa que pode agradecer depois da maldade, e que assim a
iniquidade se tornará em bondade, está enganando a si mesmo; e sua oração é
apenas seu próprio juízo. Bem-aventurado é aquele que não se condena por aquilo
que agradece. Por isto é que não é a cena das “ações de graças” o que santifica
a vida, mas a gratidão; e saiba, a gratidão sabe quando a oração é verdadeira,
visto que só os sinceros são gratos.
Oração, portanto, é aquilo que
sai do ser, e é o ser santificado. Esse tal assim o é em Deus; e o é com a
constante consciência de que n’Ele sempre se está nu espiritualmente.
Ora, num certo sentido até não
orar é uma oração, visto que oração é um ato, e não orar é, certamente, um ato.
Assim, há a oração que é
amizade com Deus, e há a oração do nada, que é inimizade para com Deus, ou
total indiferença. A oração do nada é ouvida também. E só Deus pode dizer como
Ele responde a oração do nada.
Oração é, sobretudo, confissão
de graça. Confissão da graça recebida, e confissão da graça oferecida aos
nossos devedores. Sem que seja assim, toda oração é mero discurso.
Então, para o engano daquele
que ora, aconselha-se que grite muito, e faça toda a concentração mental que
puder. Não adiantará de nada diante de Deus, mas o “devoto” vai para casa com a
dor de cabeça de quem pensa que orar é um grande esforço e que é o fruto de
muitas e muitas repetições.
Quem ora fala pouco em oração;
isto é o que tenho aprendido faz muito tempo.
Um
texto de Caio Fabio D’Araújo Filho
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